quarta-feira, 31 de agosto de 2011

INTERPRETAÇÃO DA ALIANÇA INTERNACIONAL DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA SOBRE O ARTIGO 24 DA CONVENÇÃO DOS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA (EXTRATOS)


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O Artigo 24 não menciona, propositalmente, uma educação especial/separada. Hoje, a CRPD determina que o sistema educacional deve cobrir as diversas necessidades dos estudantes, o que equivale a ter uma abordagem totalmente centrada no estudante. A existência e a forte divisão entre os dois sistemas paralelos (educação especial/separada e a educação “regular”) permanecem uma das principais barreiras na educação de crianças com deficiências (em especial com outras deficiências que não a visual e/ou a auditiva).

Escolas especiais/separadas são atualmente a principal forma de educação para o ensino fundamental e médio para crianças com deficiências em muitos lugares do mundo. Os currículos das escolas separadas muitas vezes são reduzidos, e as crianças são educadas somente entre crianças com deficiências. Os estudantes educados em um sistema de educação separada podem ser educados, em vez, em escolas inclusivas e “regulares” se feito de maneira correta e em conformidade com todas as obrigações relevantes da CRPD.

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Algumas escolas de ensino especial/separado, como todas ou a maioria das escolas “regulares”, negam aos estudantes com deficiências uma educação que leve em consideração suas necessidades. É fato que ainda existem muitas escolas para surdos ditas “tradicionais”, que não respeitam as necessidades dos estudantes surdos e discriminam seu direito de usar a língua de sinais (isto é, escolas de comunicação oral e total). Seus alunos geralmente não obtêm bons resultados de aprendizado. No entanto, algumas escolas para surdos permitem e tornam mais fácil o uso da língua de sinais e a abordagem bilíngue, de acordo com as necessidades dos alunos surdos. Para os estudantes surdos, elas não se constituem em “instituições de educação especial”, mesmo que existam dentro do sistema de educação especial. As escolas deveriam permitir e facilitar o uso da língua de sinais, além de utilizar uma abordagem bilíngue e orientada para as necessidades dos alunos.

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Uma barreira adicional ao ensino fundamental e médio para jovens com deficiências no mundo em desenvolvimento é a concepção errônea do entendimento de educação inclusiva. O conceito tradicional de educação inclusiva de crianças com deficiências significa prepará-las para se encaixar ou integrá-las aos ambientes escolares existentes, em vez de modificar as escolas para se adaptar às necessidades e ao estilo de aprendizado de todas as crianças. Além disso, a educação inclusiva também é erroneamente percebida exclusivamente como “o encerramento dos sistemas de educação especial/separada”. Os programas que acreditam que a educação inclusiva é exclusivamente o encerramento dos sistemas de educação especial ou separada e a transferência dos alunos com deficiência para a educação regular não podem ter sucesso. Tanto em países desenvolvidos quanto em desenvolvimento, o pensamento é frequentemente o mesmo: simplesmente transferir os alunos sem preparar a situação e fechar as escolas especiais.

Estes programas não levam em conta a adaptação dos estudantes ao novo ambiente, o treinamento dos professores das escolas regulares, a educação dos pais, o oferecimento do ensino em língua de sinais e a língua de sinais como uma matéria escolar, o uso de braile, o treinamento em mobilidade, outros treinamentos comunicacionais, ou outros serviços de apoio, incluindo apoio de pares, aos alunos com deficiências.

É importante mencionar que, quando pensamos em estudantes surdos e suas necessidades, precisamos considerar que a língua de sinais é a língua materna e primeira língua para uma pessoa surda. A educação na língua de sinais e a língua de sinais como matéria escolar, portanto, não são adaptações por si, mas formam uma parte normal da educação. As crianças ouvintes precisam ser educadas em suas línguas maternas e precisam estudar tal língua, e fazer isso não significa adaptar o ensino aos alunos.

Felizmente, o paradigma na educação está se alterando e há um novo foco nos princípios importantes: (i) todas as crianças devem ter o mesmo acesso à educação; (ii) crianças aprendem melhor quando aprendem juntas; e (iii) reconhecer e celebrar a diversidade e aumentar as oportunidades para participação igual. Uma educação bilíngue para estudantes surdos e ouvintes que inclua a língua de sinais como a principal língua de instrução, enquanto a língua escrita do país é utilizada para ensinar a ler, significa incorporar esta mudança de paradigma. A transposição dos alunos com deficiências para a educação regular deve levar em consideração o papel importante que o apoio de pares de outras crianças com deficiências pode desempenhar no aprendizado, como para crianças surdas, bem como promover habilidades de liderança das crianças com deficiências. As crianças surdas precisam ser incluídas primeiramente através da língua e da cultura mais apropriada antes de ser incluídas nas diferentes áreas da vida em estágios posteriores, por exemplo, no ensino médio e superior, bem como na vida profissional. O apoio de pares é necessário.

Internacional Disability Alliance, Informe apresentado na Reunião de Cúpula Ministerial Anual do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social da ONU, ocorrida entre 4 e 8 de julho de 2011, em Nova York


domingo, 10 de julho de 2011

É o lagarto o deus dos surdos

Estava em uma reunião com líderes Guarani em Coronel Sapucaia - MS e um professor indígena disse que muitas vezes quem cuida das pessoas com deficiência são os donos (deuses). Eu disse brincando sem muita informação (até por brincadeira): "Então o deus dos surdos é o Sol", pensando na natureza. "Porque surdo precisa da LUZ para se comunicar. Os olhos precisam de tempo claro, à noite é complicado".

E um dos lideres Guarni presente na reunião disse: "Não, Shirley, não é isso", com ar de mostrar  a minha santa ignorância. Na minha curiosidade perguntei quem eram os deuses e ele me respondeu escrevendo em minha agenda:

Iapysare (Guarani) significa  Surdo (LP) quem cuida deles - Donos Lagarto (Ysy'o jara)

Cegos e deficientes físicos - quem cuida deles - Donos do Arco Iris ( Iy'y jara)

Não consegui tempo para conversar mais sobre o assunto, mas registrei e estou procurando se enconto algo mais sobre donos (deuses) indígenas".

Shirley Vilhalva

quinta-feira, 23 de junho de 2011

O Direito da Criança Surda a crescer Bilingue

Toda a criança surda, independentemente do seu grau de surdez, tem o direito de crescer bilingue. Afim de poder atingir plenamente as suas capacidades cognitivas, linguísticas e sociais, e como o demonstram as investigações após longos anos, esta criança terá quase sempre necessidade de conhecer e de utilizar duas Línguas, a Língua Gestual e a Língua Oral (sob a forma escrita, e se possível falada).

O que a criança deve poder efectuar com a Língua

Graças à Língua, a criança surda, como a criança ouvinte, deve poder efectuar um determinado número de coisas:

1. Comunicar o mais cedo possível com os seus pais e família

Desde os primeiros momentos da vida, a criança começa a adquirir a língua, conforme esta lhe é exposta e que ela possa entender. É graças a esta Língua precoce que se estabelecem os laços pessoais e afectivos entre os pais e a criança. Como é verdadeiro para a criança ouvinte deve sê-lo também para a criança surda. Ela deve poder comunicar plenamente com os pais com a ajuda duma Língua natural. Esta interacção deve começar o mais cedo possível afim dos laços afectivos e sociais se construam, mutuamente, entre a criança e os seus pais.

2. Desenvolver-se cognitivamente o mais jovem possível

Com a ajuda da Língua a criança vai desenvolver as capacidades cognitivas que são indispensáveis ao seu desenvolvimento: observação, abstracção, memória, etc. A ausência de Língua, ou a presença duma Língua mal entendida ou não natural, terá um impacto nefasto sobre o desenvolvimento cognitivo da criança.

3. Adquirir conhecimentos através da Língua

É em grande parte através da Língua que a criança adquire conhecimento do mundo. A comunicação com os pais e outros parentes, com outros adultos e crianças, permitir-lhe-á a aquisição e a transmissão dos conhecimentos e da sabedoria, que formarão a base indispensável às actividades escolares. Além disso, facilitar-lhe-ão toda a compreensão da Língua, porque não há uma real compreensão sem conhecimento do mundo.

4. Comunicar plenamente com o mundo próximo

A criança surda, como a criança ouvinte, deve poder comunicar de modo pleno com aqueles que a cercam (pais, irmãos, outras crianças, professores, adultos, etc.). Deve poder fazê-lo através duma forma de comunicação ideal e na Língua mais apropriada à situação. Em certos casos, será a Língua Gestual, noutros a Língua Oral, e por vezes as duas Línguas em alternância.

5. Aculturar-se nos dois mundos que serão os seus

A criança surda deve gradualmente tornar-se membro dos dois mundos aos quais pertence. È necessário que se identifique, ao menos parcialmente, com o mundo ouvinte, o mundo dos seus pais e da sua família na maior parte dos casos. Mas deve também poder entrar em contacto com o mundo dos Surdos o mais precoce e rapidamente possível. A criança surda deve poder sentir-se bem nestes dois mundos e identificar-se com eles, qualquer que seja o grau desta identificação. É necessário fazer tudo para que a descoberta destes dois mundos tenha lugar de maneira precoce que a integração nos mesmos se faça sem dificuldade.

A ÚNICA MANEIRA DAÍ CHEGAR: O BILINGUALISMO

O Bilingualismo, Língua Gestual / Língua Oral, parece ser a única via aberta para proporcionar à criança surda uma comunicação precoce com os pais, um desenvolvimento cognitivo ideal, uma aquisição de conhecimento do mundo, um contacto linguístico com o que a rodeia, bem como uma aculturação no mundo dos surdos e também no dos ouvintes.

Que tipo de bilingualismo?

O bilingualismo procurado será um bilingualismo que respeite a língua gestual e a língua oral (na sua forma escrita e, se possível, oral). Certamente que estas duas línguas terão um papel diferente dependendo da criança (dominante a língua gestual entre umas, dominante a língua oral entre outras, equilíbrio entre as duas línguas para algumas). Além disso será necessário prever diferentes géneros de bilingualismo visto que os tipos de surdez que se vão encontrando são diferentes e o contacto entre estas duas línguas é muito complexo. Assim a maioria das crianças surdas estão destinadas a ser bilingues e biculturais, à imagem de grande parte da população mundial. À semelhança de outras crianças bilingues, as crianças surdas utilizarão duas línguas na vida quotidiana e pertencerão a dois mundos - neste caso o mundo dos surdos e o dos ouvintes.

Qual o papel da língua gestual?

A língua gestual deverá ser a primeira língua (ou uma das duas primeiras línguas) das crianças surdas. É a sua língua natural, duma riqueza incontestável e que proporciona uma comunicação total. Contrariamente à língua oral permite uma comunicação precoce e excelente entre os pais e o bebé surdo (condicionada que aqueles, sendo ouvintes, a aprendam o mais cedo possível), ela estimula o desenvolvimento cognitivo e social rápido, ela permite a aquisição do conhecimento do mundo, ela permitirá à criança surda aculturar-se ao mundo dos surdos (um dos seus dois mundos) logo que a criança tenha contacto com ele. Além disso a língua gestual irá possibilitar uma aquisição mais fácil da língua oral, seja sob a forma oral ou escrita. Efectivamente possuir uma língua bem enraizada facilita muito a aquisição doutra língua (seja a primeira língua uma língua oral ou uma língua gestual). Enfim, a língua gestual é garantia de que a criança surda terá pelo menos uma língua bem estabilizada, visto ser bem conhecido que o nível atingido na língua oral é geralmente insatisfatório, quaisquer que sejam os esforços feitos e os meios tecnológicos disponibilizados. Aguardar vários anos para atingir um determinado nível em língua oral, sem possibilitar à criança surda durante o mesmo período a utilização da língua que é a sua língua natural e mais lhe convém desde os primeiros tempos, a língua gestual, é expô-la a um enorme atraso linguístico, cognitivo, afectivo e social.

Qual o papel da língua oral?

Ser bilingue significa conhecer e utilizar duas ou mais línguas. A outra língua da criança surda será portanto a língua oral, sob a sua forma falada e/ou escrita. Esta língua é aquela do outro mundo ao qual pertence a criança surda, o mundo dos ouvintes, normalmente aquele dos seus pais, irmãos, familiares e de muitos dos seus futuros conhecidos, colegas e amigos. Se os membros do seu círculo não sabem a língua gestual, é indispensável que a criança surda possa comunicar com eles, pelo menos parcialmente, através da língua oral. Esta língua, principalmente sob a sua forma escrita, será igualmente a condutora de numerosos conhecimentos que serão adquiridos primeiro em casa e, mais tarde, na escola. O futuro da criança surda, seu sucesso escolar e, por arrastamento, o seu desenvolvimento profissional dependerão em grande parte dum domínio regular da língua oral, pelo menos ao nível escrito e se possível oral.

CONCLUSÃO

É dever da Sociedade permitir que a criança surda aprenda as duas línguas, a língua gestual (como primeira língua) e a língua oral. Para tal a criança surda deve entrar em contacto com utilizadores das duas línguas e deve sentir a necessidade de utilizar as duas. Forçar só a língua oral baseando-se nos novos avanços tecnológicos, é arriscar o futuro da criança surda. É uma tomada de posição que envolve grandes riscos relativamente ao seu desenvolvimento humano, é colocar em perigo o seu futuro pessoal, é negar a sua necessidade de aculturação nos dois mundos a que pertence. Faça o que fizer no futuro, qualquer que seja o mundo que a criança surda vier a escolher em definitivo (no caso de não pretender "pertencer" aos dois), um bilingualismo precoce dar-lhe-á mais garantias para o futuro que apenas o monolingualismo.
Ninguém se pode lamentar de conhecer mais do que uma língua, mas poderemos lamentar-nos de não conhecer nenhuma, sobretudo quando o nosso normal desenvolvimento disso depende.

A CRIANÇA SURDA TEM O DIREITO DE CRESCER BILINGUE. E UM DOS DEVERES DA SOCIEDADE É TUDO FAZER PARA QUE TAL SEJA POSSÍVEL.

Adaptação de um Trabalho de François Grosjean
Fonte: Associação de Surdos do Porto (Portugal)

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Foi bonita a festa, pá. Fiquei contente. Ainda guardo renitente um velho cravo para mim.


Eles são Estado, nós somos povo. Eles estão nos gabinetes, amedrontados, nós estamos nas ruas e praças. Eles já não se encontram sorridentes e esperançosos, mas cansados e preocupados. Nossos encontros são de descoberta e festa. Eles estão segregados da vida, nós somos a vida com toda sua força. Eles são o passado que resiste a morrer, nós somos o futuro que persiste em nascer. Dias 19 e 20 foram só o começo. A luta continua! Venceremos!

Detalhe da manifestação de surdos e amigos na quinta, dia 19/maio

Uma visão mais ampla da manifestação em frente à Secretaria de Diversidade e Inclusão do MEC


A delegação cearense  às manifestações dos dias 19 e 20 de maio em Brasília


sexta-feira, 13 de maio de 2011

Mariana Hora dá uns ensinamentos a Tereza Mantoan


Dá-lhe, Mariana! Quem mandou Tetê falar o que não sabe?

Professora Doutora da Unicamp, a senhora Maria Tereza Mantoan está puxando um abaixo assinado on line contra o movimento dos surdos de solidariedade ao INES e pela educação bilíngue. No email em que solicita assinaturas, a tal doutora em educação faz uma série de considerações sem fundamento sobre a luta dos surdos. A companheira Mariana Hora (foto), surda de Recife, em email aberto à douta senhora, faz os esclarecimentos necessários e lhe ensina o que ela não aprendeu em casa (ter respeito aos outros) nem em seu doutorado (o conhecimento da luta surda)...

 

 Em resposta ao e-mail da Sra. Maria Teresa Mantoan



por Mariana Hora, quinta, 12 de maio de 2011 às 16:44

Cara Professora e demais simpatizantes da Educação Inclusiva,

Venho educadamente, solicitar sua atenção. Estarei aqui me referindo ao texto, assinado pela professora acima citada, que circula via e-mail divulgando o abaixo-assinado contido no site: http://www.peticaopublica.com.br/?pi=INCLUSAO.

Abaixo farei algumas singelas observações:

1- “E tudo isso porque as pessoas que apoiam as políticas de segregação e assistencialismo das escolas especiais estão aproveitando a mudança de governo para tentar retomar o espaço que perderam por causa da nossas conquistas na inclusão (digo nossas porque essa é uma luta de todos nós).”

Não deixou claro quem são estas pessoas, eu espero que não esteja se referindo à comunidade surda que está organizando as manifestações em Brasília para os dias 19 e 20 de maio. Não defendemos assistencialismo (eu inclusive sou Assistente Social e, caso estivesse participando de um movimento que defendesse assistencialismo estaria sendo antiética e desrrespeitando os príncipios fundamentais da minha profissão), muito menos ainda defendemos segregação.

2- “Nós sabemos muito bem que a proposta do MEC foi flexível: permitiu que as escolas especiais não fechassem, mas que, em vez de escolarizar, apenas oferecessem o AEE. No entanto, manipulam a imprensa e a opinião pública, dizendo que o MEC vai fechar o INES, o Instituto Benjamin Constant e outras intituições "importantes para a sociedade". Com isso, TENTAM MODIFICAR NOSSAS LEIS PARA REGULARIZAR DE VEZ A ESCOLA ESPECIAL!!! Isso é muito grave.”

Flexível? A Constituição Federal diz que a educação das pessoas com deficiência deve ser feita PREFERENCIALMENTE em escolas regulares, isso é bem diferente de dizer OBRIGATORIAMENTE. Estamos defendendo a nossa liberdade, a nosso direito de escolha.  O movimento dos surdos não está defendendo o fim da Educação Inclusiva, estamos defendendo o direito das Escolas Bilíngues para Surdos de existirem como ESCOLA e não como AEE.

3 – “Não podemos esquecer que os opositores da inclusão são fortes perante a opinião pública. Bradam que "a sociedade" quer a escola especial. Mas nós todos sabemos que isso não é verdade. E VAMOS FICAR PARADOS??? Tenho certeza de que não. Temos que mostrar que existe um exército que luta todo santo dia para fazer a inclusão nesse país dar certo. Temos que dar voz às mães e aos pais que choram quando vêem que o filho tem direitos, que aprendeu, fez amigos, avançou, está feliz..."

Para sua ciência estive recentemente no Instituto Benjamim Constant no RJ, assisti uma reunião na qual pais choraram, gritaram, mostraram toda sua revolta com a possibilidade de fechamento da escola da instituição. Não são TODOS os pais de crianças com deficiência que querem colocar seus filhos na Escolas Inclusiva, pense nisso, por favor.

É apenas na Escola Inclusiva que as crianças com deficiência tem direitos, aprendem, fazem amigos, estão felizes??? Crianças surdas que estudam em Escolas de Surdos são felizes, tem amigos, aprendem e tem direitos!

4- "Está havendo uma manipulação da informação para deixar a população contra as política de inclusão do MEC e para, inclusive, derrubar a secretária de Educação Especial e sua equipe (tem uma passseata marcada em Brasília para o dia 19 de maio)".

Aproveito que você falou em MANIPULAÇÃO, e digo que foi o que certas pessoas ligadas ao MEC e outras entidades fizeram na Conferência Nacional de Educação (CONAE-2010) contra os delegados surdos que estiveram lutando pelas propostas de educação de surdos. Eles foram totalmente desrespeitados e têm provas disso.

Tem uma passeata marcada sim, e é para os dias 19 e 20 de maio. Vamos apresentar propostas para Educação de Surdos e exigir o respeito à Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência (lá diz que deve ser respeitada à Cultura Surda, a Língua Sinais e a Identidade dos Surdos), a Lei de Libras (10.436/2002) e o Decreto 5.626/2005.  Além de outros documentos que nos garante o direito de ter uma educação em Língua de Sinais.

Não estamos manipulando ninguém, só queremos ser respeitados e “ouvidos”.

5- "E, pior de tudo, é que, em meio a todo esse absurdo, as crianças são o que menos contam".

Pelo contrário, estamos lutando por um futuro melhor para as crianças surdas. Resumidamente: Nós queremos Escolas Bilíngues para Surdos com qualidade. Bilíngue siginifica respeitar a Libras como primeira língua e o português escrito como segunda língua. Porque não investem na melhoria das escolas existentes ao invés de fechá-las?

O abaixo-assinado em Defesa do INES está no ar para ser assinado por quem concorda com o que está escrito nele. Claro que vocês têm direito de manifestar a opinião de vocês e fazer o abaixo-assinado de vocês.

Eu só estou pedindo RESPEITO. Respeito a pluraridade de idéias, pensamentos, teorias. Respeito à Libras, à Cultura Surda, aos Surdos que tanto lutaram e hoje estão conseguindo cada vez mais atingir espaços antes fechados para nós. Respeito ao direito de escolha. Respeito ao direitos dos surdos de terem uma educação de qualidade em sua língua (Libras) e num espaço propício ao desenvolvimento e fortalecimento da identidade surda.

Parem de nos chamar de segregacionistas, é um acusação falsa e injusta. Temos direito de sinalizar (falar em Língua de Sinais) nossas propostas, nossos anseios e desejos.  Temos direito de reclamar e lutar contra pessoas que afirmam não existir cultura surda e/ou que Libras não é língua.

Respeitosamente,
Mariana Hora

Surda, Assistente Social, Criadora do abaixo-assinado em Defesa do INES (http://www.peticaopublica.com.br/PeticaoVer.aspx?pi=LutaINES), Participante da Comissão de Organização do Movimento Surdo em favor da Educação e Cultura Surda – Brasília 19 e 20 de maio).

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Dicionário Voltaire / Verbete: estupidez

Estupidez: s.f. O primeiro registro da palavra se deu em 1789, mas com muita atualidade em 2011. Significa Rossana Ramos, Pós-Doutoranda em História e Linguística pela Universidade Federal da Bahia; Doutora em língua portuguesa pela PUC/SP (2005); Mestra em Lingua Portuguesa pela PUC/SP (2001); Especialista em Lingua Portuguesa PUC/MG (1989); Graduada em Letras - SESAT (1985); graduada em Pedagogia com Habilitação em Administração Escolar. Professora Adjunta da Universidade de Pernambuco, fundadora e diretora da Escola Viva de Cotia. Tem quinze livros cometidos na área infantil e pedagógica, no Brasil e no exterior pela Cortez Editora, Summus Editorial e Pró-infanti Editora. Tem experiência na área de Letras, em Língua Portuguesa e Artes, atuando principalmente nos seguintes temas: escrita, leitura, literatura infantil e educação inclusiva.  Disse recentemente essa estúpida, em Palestra em Camãqua (RS), que o atendimento especial é inútil, tanto quanto as escolas especiais; que TODOS os alunos devem estar em uma mesma sala de aula, sem nenhum outro tipo de suporte (exceto casos muito extremos), que "alguma coisa" com certeza eles acabarão aprendendo. Afirmou também com todas as letras que LIBRAS não é LINGUA, que ela como linguista sabe muito bem disso, que a lei de Libras é uma PIADA, criada apenas por pressão de uma cúpula. E foi além: SURDO TEM QUE SER ORALIZADO, pois aí sim aprenderá de verdade como qualquer outra pessoa, QUE LÍNGUA DE SINAIS NÃO É MEIO DE APRENDIZADO PARA NINGUÉM. Ela diz clramente, à luz do dia, o que Martinha Claret acalenta, em silêncio, em seu coração.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Estudo em portugal demonstra que alunos surdos se desenvolvem melhor em escolas especiais

Só chamo a atenção para o fato de que o uso da expressão "escola especial" não é da investigadora, que prefere usar o nome mais correto: "escola bilíngue". Quando esse artigo foi publicado, não existiam ainda em Portugal as escolas bilíngues LGP/Português, que hoje convivem com escolas inclusivas, tendo os surdos e suas famílias o direito de escolha. É por isso que nós lutamos aqui no Brasil.


CIÊNCIA HOJE (REVISTA PORTUGUESA)
2007-07-19

As crianças surdas que frequentam a escola normal estão em desvantagem relativamente às que estudam em escolas especiais, conclui um estudo da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) hoje divulgado.

O estudo abrangeu dois grupos de crianças surdas, com idades compreendidas entre os seis e os 12 anos, um integrado no ensino normal e o segundo com frequência no ensino bilingue (que aprende a língua gestual a par da língua portuguesa escrita).

A coordenadora do estudo, a psicóloga e investigadora da FMUP Ivone Duarte, referiu que "os resultados demonstraram que as crianças surdas que frequentam as escolas normais apresentam piores resultados ao nível da comunicação, integração social e capacidade associativa e cognitiva, quando comparadas com as integradas no ensino bilingue".

A investigadora concluiu que a falta de uma língua impede estas crianças de compreenderem o que as rodeia, de comunicarem eficazmente e de socializar, o que compromete o seu desenvolvimento e as pode deixar frustradas e ansiosas. Em contrapartida, as crianças inseridas em escolas bilingues, e que dominam a língua gestual, vivem mais calmas e mais seguras, estão mais aptas a explorar o meio e a estabelecer relações com os outros e, por isso, desenvolvem-se mais eficientemente.

O estudo conclui que "os resultados positivos obtidos pelas crianças com acesso ao ensino bilingue são ainda mais evidentes nas que iniciaram a aprendizagem da língua gestual com três anos ou menos, o que sublinha a necessidade de que a aprendizagem desta língua ocorra o mais prematuramente possível".

"Isso exige a implementação do rastreio de surdez neonatal em todos os hospitais e maternidades, o que permitirá identificar e encaminhar devidamente os bebés com deficiência auditiva", defendeu a investigadora. O sistema educativo português integra as crianças surdas nas escolas convencionais, apesar destas não responderem às necessidades comunicativas dos alunos surdos.

Ivone Duarte propõe que se criem escolas próprias, que integrem surdos e ouvintes, mas que possuam ensino bilingue. "As crianças surdas não têm qualquer necessidade de currículos alternativos ou adaptados, bastando-lhes o acesso a uma língua que lhes permita apreender o mundo e desenvolverem-se plenamente", afirmou.

No âmbito das investigações levadas a cabo pela FMUP relativamente à problemática da surdez, o Serviço de Bioética da Faculdade organiza amanhã o "V Simpósio sobre Reabilitação da Criança Surda". No encontro, que tem início às 15:00 horas, na Aula Magna da FMUP, participam Rui Nunes, Ivone Duarte e Luísa Simões, entre outros especialistas.

domingo, 1 de maio de 2011

Mãos que falam, mãos que abençoam


"Os outros ouvem, eu não. Mas tenho olhos, que forçosamente observam melhor do que os deles. Tenho as minhas mãos que falam..." (Emmanuelle Laborit, 1994)


"Pronunciar palavras eu posso, sim, converso com quem não sabe LIBRAS, normalmente. Mas no meu nome, na minha vida, na minha história, tenho como marca as minhas mãos, a minha forma de me comunicar: a LIBRAS! Esse bailado que sempre sugerirá benção, edificação. A mão é o verbo dos eleitos" (Vanessa Vidal,  2008)

segunda-feira, 25 de abril de 2011

MARTINHA CLARET PEGA NA MENTIRA!


A prova material do falso testemunho de Dona Martinha Claret e da farsa em que se tornou a CONAE/Nacional


O professor Neivaldo Zovico, que participou da Conferência Nacional de Educação, em 2010, em Brasília, denunciou no ano passado à Revista da Feneis (2010, nº 40) que o MEC havia pressionado os delegados que participaram do grupo do eixo 6, cuja temática era "Justiça social, educação e trabalho: inclusão, diversidade e igualdade", a votarem contra as propostas dos surdos. O absurdo é que, assim, os delegados ali presentes quebraram um acordo  estabelecido entre todos de que as propostas de cada movimento social seria integralmente aprovado, pois cada setor da sociedade compreendia melhor suas próprias reivindicações. Dona Martinha Claret declarou nesse mesmo número da revista que a Secretaria de Educação Especial do MEC não fizera nada daquilo que o Professor dissera (veja em http://lutas-surdas.blogspot.com/2011/04/propostas-dos-surdos-i-conferencia.html). Agora vem a público a foto do papel que a SEEsp/MEC distribuiu entre os delegados à CONAE pressionando-os para que o acordo fosse quebrado e as propostas dos surdos, rejeitadas! É um escândalo que deve ser denunciado e que representa bem a farsa que foi a CONAE/Nacional e o tipo de peleguismo da maioria dos movimentos sociais lá presentes! Agora ficam chorando porque suas propostas não foram incluídas no Projeto de Lei encaminhado ao Congresso Nacional.

Vejam nessa foto que a SEEsp/MEC considera uma proposta "segregacionista" o sagrado direito dos surdos e pais de optarem por qual modelo de escola querem para si ou para seus filhos!  E ainda diz que sua posição é de respeito aos direitos humanos. Da mesma forma é contra a existência de escolas de educação bilíngue, coisa estabelecida e definida pelo Decreto 5.626/2005, assinada por seus chefes, Lula e  Fernando Haddad.

Essa postura voluntarista, autoritária e etnocida de Claudia Dutra e Martinha Claret simplesmente rasga o Decreto 5.626/2005, que institucionalizou a escola de educação bilingue, e a Declaração de Salamanca, que diz textualmente:

“Qualquer pessoa portadora de deficiência [sic] tem o direito de expressar seus desejos com relação à sua educação, tanto quanto estes possam ser realizados. Pais possuem o direito inerente de serem consultados sobre a forma de educação mais apropriada às necessidades, circunstâncias e aspirações de suas crianças” (Introdução, § 2).

“Políticas educacionais deveriam levar em total consideração as diferenças e situações individuais. A importância da linguagem de signos como meio de comunicação entre os surdos, por exemplo, deveria ser reconhecida e provisão deveria ser feita no sentido de garantir que todas as pessoas surdas tenham acesso a educação em sua língua nacional de sinais. Devido às necessidades particulares de comunicação dos surdos e das pessoas surdocegas, a educação deles pode ser mais adequadamente provida em escolas especiais ou classes especiais e unidades em escolas regulares” (Art. 21).

domingo, 24 de abril de 2011

sábado, 23 de abril de 2011

PROPOSTAS DOS SURDOS À I CONFERÊNCIA NACIONAL DE EDUCAÇÃO (2010)


Passeata de estudantes, familiares e professores do INES
 Resumo das propostas aprovadas:

*Garantir a oferta de atendimento educacional à criança surda, do nascimento aos três anos, propiciando a imersão em língua de sinais como primeira língua;

*Oficializar a profissão de tradutor-intérprete de Libras e de guia intérprete para surdos e cegos e garantir a presença desses profissionais nas escolas e instituições de ensino superior;

*Garantir que a formulação e a execução da política linguística sejam realizadas com a participação dos educadores surdos e demais lideranças da comunidade surda.

Resumo das propostas rejeitadas:

*Garantir às famílias e aos surdos o direito de optar pela modalidade de ensino, garantindo o acesso à educação bilíngue;

*Garantir e ampliar o atendimento de serviços de intervenção precoce em crianças de até três anos;
*Garantir o contato dos alunos surdos com professores surdos, oportunizando sua identificação linguística e cultural;

*Consolidar o ensino de Libras nos cursos de formação de professores, incluindo temáticas como artes, literatura, gramática da língua de sinais e história dos movimentos surdos. Incluir esse temas também nos currículos das escolas de surdos e nas escolas com alunos surdos incluídos;

*Incentivar e apoiar financeiramente a criação do Curso de Graduação em Pedagogia Bilíngüe;

*Inserir prova de proficiência em Libras nos concursos e em outros processos seletivos para professores que atuarão com alunos surdos.

Explicação:


Segundo o delegado Neivaldo Zovico, houve um forte lobbie das entidades favoráveis à escola inclusiva, perspectiva também apoiada pelo governo. Ele explica que a conferência foi dividida em seis subtemas e que as propostas sobre os surdos entraram no eixo seis "Justiça social, educação e trabalho: inclusão, diversidade e igualdade". "Durante a fase de discussão interna ao eixo seis fizemos um acordo de que todos votaríamos a favor das propostas apresentadas pelos diferentes grupos – negros, quilombolas, Movimento dos Sem Terra, dentre outros. Partimos do princípio de que ninguém conhece melhor a realidade do que aqueles que a vivenciam", relata o delegado, que também é professor.

No momento da votação, sete propostas foram totalmente rejeitadas, três aprovadas com 50% e uma obteve 30%. Neivaldo argumenta que os dirigentes governistas manipularam o grupo. "Nas nossas costas, depois de sairmos da plenária, os participantes do eixo seis foram chamados para uma reunião com representantes do Governo Federal e de ONG’s conveniadas ao Ministério da Educação (MEC). Eles os convenceram a votar contra as propostas destacadas pelo grupo de surdos, acusando nossas ideias de segregacionistas. Os únicos movimentos que nos apoiaram até o fim foram a Liga Brasileira de Lésbicas (LBL) e a Educação do Campo", explica Neivaldo.

MARTINHA CLARET CONTRA O DECRETO 5.626/2005: "NÃO EXISTE CULTURA SURDA"

Dona Martinha Claret
A legislação diz assim: "Art. 2o  Para os fins deste Decreto, considera-se pessoa surda aquela que, por ter perda auditiva, compreende e interage com o mundo por meio de experiências visuais, manifestando sua cultura principalmente pelo uso da Língua Brasileira de Sinais - Libras" (Decreto 5.626/2005, que regulamenta a Lei 10.436/2002).

Já Dona Martinha Claret, da Secretaria de Educação Especial do MEC, diz assim: " [...] do ponto de vista da educação inclusiva, o MEC não acredita que a condição sensorial institua uma cultura. As pessoas surdas estão na comunidade, na sociedade e compõe a cultura brasileira. Nós entendemos que não existe cultura surda e que esse é um princípio segregacionista. As pessoas não podem ser agrupadas nas escolas de surdos porque são surdas. Elas são diversas. Precisamos valorizar a diversidade humana" (Revista da Feneis, 2010, nº 40, on line, em http://xa.yimg.com/kq/groups/12791016/1208760312/name/DOC008.PDF).

Conclusão: a lei reconhece que há uma cultura surda, que se manifesta principalmente pela língua de sinais; admite, portanto, que o ponto de partida do reconhecimento dessa cultura é a língua de sinais. Já Dona Martinha Claret nem reconhece a Libras, referindo-se aos surdos apenas como portadores de uma "condição sensorial"; em consequência, conclui que não há uma cultura surda.

Minha opnião: Dona Martinha Claret tem, em princípio, toda razão: a cegueira não funda uma cultura; a surdez, por si só, enquanto dado clínico, não funda uma cultura. Contudo, uma língua funda uma cultura. A questão é: Dona Martinha reconhece a Libras como uma língua? Parece que não... Dona Martinha é contra a Lei 10.436/2002 e o Decreto 5.626/2005. Portanto, ela não deveria estar onde está!


quinta-feira, 21 de abril de 2011

KARIN STROBEL, SOBRE A LÍNGUA DE SINAIS: "MINHA IDENTIDADE, NÃO SÓ COMO SURDA, MAS COMO KARIN"

Karin Lilian Strobel
Na maior parte de minha infância estudei em uma escola para surdos de Curitiba onde usavam metodologia oralista, que foi implantada recentemente na época, horas e horas de treinamento com as aparelhagens e fones diante de espelhos para imitar as articulações dos lábios.

Consequentemente, aprendi a falar, mas não sabia me comunicar adequadamente, só ficava repetindo as palavras, igual a um papagaio sem entender seus significados, tudo muito mecânico e sem emoções, somente depois de aprendizagem de libras durante a adolescência é que me libertei desse mundo de clonagem dos ouvintes e me expressei autentica ‘eu’ que estava adormecido no interior!

Paralelamente com a escola para surdos, estudei em outro período do dia em muitas escolas inclusivas e reprovei várias vezes – não por preguiça e sim por dificuldades de adaptação à cultura ouvinte, por exemplo: na minha fase de alfabetização em escola de ouvintes, a professora em sala de aula mostrava figuras de alface, avião e abacaxi e comparava-as com letra ‘a’, eu não entendia o porquê dessas comparações, pois não encontrava a letra ‘a’ nas figuras. Olhava, olhava e ficava confusa, isto porque na cultura ouvinte, nestas escolas, os professores ensinavam a língua portuguesa em associação aos sons, outra situação parecida é, dentro de textos, a gente tem de perceber quais as palavras são oxítonas, paroxítonas, etc. Eu, surda, como vou perceber qual sílaba é mais forte se não escuto? E pior ainda, ter que separar as palavras em silabas? Será que separar palavras de duas-letras e duas-letras esta correta? Isto fazia a minha cabeça ficar confusa, porque nestas escolas não ensinavam a língua portuguesa na cultura surda, isto é, o português visual. Também faziam brincadeirinhas do tipo ‘telefone-sem-fio’ e isto me fazia sentir um ‘peixe fora de água’!

Durante toda a minha vida escolar, com exceção de mestrado e doutorado, eu não tive intérprete em sala de aula e, na universidade, ao cursar o curso de pedagogia, também enfrentei dificuldades; os professores não tinham conhecimentos de como lidar com uma pessoa surda e também não tinha intérprete disponível. Na maior parte baseei mais nas leituras dos livros para manter-me atualizada.

Ao ingressar em UFSC durante o mestrado e com upgrade para doutorado, tive oportunidade de encontrar colegas e professores usuários de língua de sinais, de assistir aulas com intérprete de língua de sinais/português e participar juntamente no grupo GES – Grupo Estudos Surdos, onde se desenvolvem pesquisas na área dos Estudos Surdos.

Conclui o meu doutorado este ano [2008] com a tese que aborda algumas reflexões sobre analogia de poderes em relação ao corpo surdo e modos possíveis de abordar em sua subjetividade daqueles que considero ‘personagens’ de minha pesquisa: o ser surdo! Nela há narrativas produzidas pelos sujeitos surdos que foram entrevistados durante a pesquisa no sentido de identificar as descrições sobre visões históricas diferenciadas que permitam construir a história de surdos no espaço colonial ou como sujeitos surdos na diferença linguística cultural.

O meu primeiro contato com a língua de sinais aconteceu na adolescência, com quinze anos, na época em que estava revoltada e triste sem saber qual era o meu espaço no mundo, porque a escola para surdos proibia o uso de língua de sinais e nas escolas regulares eu conversava igual como papagaio e os colegas ouvintes me achavam chata e me deixavam isolada. Então a minha mãe ficou preocupada com a minha revolta e tristeza e após investigar as existências das comunidades surdas ela me levou à associação dos surdos de Curitiba onde tive o primeiro contato com a língua de sinais e isto me fez abrir as muitas portas para o mundo e permitiu eu construir a minha identidade, não só como surda e sim como a ‘Karin’!


Karin Strobel é surda, Doutora em Educação (UFSC) e Presidenta da Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos (FENEIS)
Fonte: Revista Virtual de Cultura Surda e Diversidade (http://editora-arara-azul.com.br/novoeaa/revista/?p=131)

terça-feira, 12 de abril de 2011

CHAMADA PARA O DIA NACIONAL DE LUTA EM DEFESA DA LIBRAS E DA CULTURA SURDA

A Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos está chamando os surdos de todos o país, seus pais, amigos e educadores a fazermos uma grande manifestação em Brasília, em 20 de maio, em defesa da língua, da educação e da cultura surda. Veja nesse vídeo abaixo o chamado de Messias Ramos Costa, Diretor Regional da Feneis (DF). Em todos os Estados, inclusive o Ceará, estamos nos mobilizando, renunindo, debatendo...

A INCOERÊNCIA DA INCLUSÃO ESCOLAR IMPOSTA AOS SURDOS


Rodrigo Nogueira Machado
Sou surdo, tenho 28 anos, nasci em Quixeramobim/CE, já concluí dois cursos superiores: Bacharelado em Geografia pela Universidade Luterana do Brasil – ULBRA e Letras Libras pela Universidade Federal do Ceará, pólo da Universidade Federal de Santa Catarina.

Nos meus primeiros anos escolares, estudei numa escola de surdos onde o método era ensinar a falar, (oralismo), muito boa pelo compromisso com o trabalho e a organização; no entanto, não pude avançar conforme minha vontade e possibilidades. Aos 12 anos fui para uma escola inclusiva, éramos 02 a 03 surdos em salas de 20 a 30 alunos ouvintes. Foi muito difícil, perdi o contato com meus colegas surdos e não conseguia ter amigos ouvintes e nem entender os conteúdos escolares, pela falta da comunicação.  Precisava da ajuda da minha mãe, que em casa, tentava me ensinar usando sinais. Lembro que nos primeiros dias de aula havia aproximação e curiosidade dos “colegas”, depois cada um se relacionava com seus pares e nós surdos ficávamos meio perdidos, isoladas.

Nesta época eu já sabia Libras que aprendi na convivência com meus irmãos, (sou o 3° de quatro irmãos surdos), e com meus amigos na associação dos surdos. Sempre fui muito curioso, gostava de estudar, de conhecer as coisas e depois de algumas vivências, de conhecer a importância da língua de sinais para o conhecimento e desenvolvimento dos surdos, percebi que numa escola só de surdos onde a língua fluente fosse a LIBRAS eu poderia aprender mais, me sentir integrado e feliz.  Procurei na internet, conhecer algumas escolas que atendessem às minhas necessidades. Com  o incondicional apoio da minha família, fui para Porto Alegre/RS, fazer o ensino médio numa escola só para surdos, conforme eu sonhava.

Foi maravilhoso, as salas de aula nesta escola são temáticas. Quando entrei na sala de Geografia, minha mãe diz que meus olhos brilharam. Senti-me muito feliz. Todos na escola falavam Libras. Foi um enorme crescimento pra mim. Terminei o ensino médio e em seguida ingressei na Universidade Luterana do Brasil – ULBRA, em Canoas/RS, onde cursei bacharelado em Geografia.

Nesta etapa fiquei em sala inclusiva com apoio de intérprete fluente em Libras. Como já dominava essa língua não tive dificuldades em acompanhar as disciplinas. Conclui o curso no período normal (08 semestres), em seguida, fiz concurso para professor em Caxias do Sul e fui aprovado. Enquanto aguardava ser chamado, resolvi viajar à Europa na busca de conhecer outras realidades, visitei 12 países, somente usando a Língua de Sinais Internacional e o inglês escrito, na comunicação, não tive dificuldades. Fiquei quatro meses na Dinamarca onde fiz um curso de Liderança Mundial de Jovens Surdos, foi uma experiência fantástica, enriquecedora; éramos 14 jovens cada um de um país e em pouco tempo tivemos que aprender as diferentes línguas de sinais. Aprendi também, inglês e espanhol escrito.

Em 2006, após a oficialização da Libras como língua natural dos surdos, o Governo Federal, através do MEC implantou o curso de Letras Libras para a formação de professores surdos e intérpretes de Libras na Universidade Federal de Santa Catarina. Ingressei nesse curso. Ano passado, cansado de morar sozinho, retornei a Fortaleza e transferi o curso de Letras Libras para a Universidade Federal do Ceará. Colei grau no início deste ano, juntamente com 32 colegas surdos. Com este depoimento, quero mostrar que nós surdos não precisamos estudar em escola inclusiva para ser integrado socialmente. Precisamos sim, que entendam que somos capazes, que podemos produzir e ser cidadãos.

Nós surdos formados, esperávamos fazer concurso e atuarmos como professores de surdos, no entanto, fomos surpreendidos com a determinação do MEC em matricular as pessoas com necessidades especiais nas escolas regulares, nós formandos, estamos sem perspectivas de trabalho e os surdos perdidos nas escolas “inclusivas.” Não somos contra a política de inclusão, mas o sistema de ensino no país que não está preparado para lidar com as diferenças.

Portanto, peço aos nossos governantes que procurem ouvir os surdos e revejam esse processo de inclusão imposta pelo MEC e que aqui está sendo implantado sem as condições. Sem professores e interpretes de libras, principalmente no interior do Estado. Não posso me calar diante dessa situação. Temos uma língua diferente, a língua de sinais, que não tem como desenvolvê-la na convivência com pessoas que falam português. Não é isso que nós surdos precisamos e queremos.

- Queremos o direito de ser surdo: ser respeitado pela sociedade pela singularidade lingüística e cultural.

- Queremos o direito de uma educação diferenciada, pautada pelo uso da língua de sinais e o aprendizado da língua portuguesa como segunda língua, (escola bilíngüe).

- Queremos a formação dos próprios surdos para atuar como docentes, por meio de concurso que nos dêem estabilidade.

- Queremos o direito de ser uma comunidade respeitada socialmente deixando de ser discriminada e taxada como queto, segregação. Para mim , segregar é colocar em escolas sem comunicação, sem entender o que conversam e falam na sala.

- Queremos o direito de escolher em que escola estudar.

Concluo minhas palavras com um trecho da seguinte poesia:

“Recuso-me a ser considerada especial, deficiente. Não sou. Sou surdo. Para mim a língua de sinais corresponde a minha voz; meus olhos são meus ouvidos. Sinceramente nada me falta. É a sociedade que me torna excepcional.” (Vôo da Gaivota, Emanuelle Laborrit).

Rodrigo Machado é surdo, Bacharel em Geografia (ULBRA), Licenciado em Letras/libras (UFC) e Professor do Instituto Cearense de Educação de Surdos (ICES)
Fonte: lista de discussão surdos-ce@yahoogrupos.com.br

PEDAGOGA SURDA, PROFESSORA DA UFSC CRITICA POLÍTICA DE INCLUSÃO


Patrícia Luiza Ferreira Rezende
Infelizmente, a Lei da Libras, o decreto e a Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com deficiência não têm sido cumpridos a contento pelo Mec. A atual política de inclusão insiste em colocar crianças surdas junto com as ouvintes sem haver um compartilhamento linguístico entre elas. Porque nesses espaços as crianças surdas oriundas de familia ouvintes não adquirem sua língua natural de forma espontânea como as crianças ouvintes que compartilham a mesma língua da sua familia interagindo e obtendo informações e assim construindo o conhecimento de mundo que é aprofundado na escola. Como ter inclusão se não há aquisição linguística pela criança surda?

A língua de instrução utilizada em todos os espaços escolares da escola inclusiva é o português. No máximo, os alunos contam com a presença de intérpretes de língua de sinais durante as aulas, o que muitas vezes torna inviável o ensino já que a criança surda nem sequer domina Libras e muito menos possui conhecimento prévio de mundo por meio de língua nenhuma. Mas a metodologia de ensino continua sendo a mesma para surdos e ouvintes. O português é ensinado como primeira língua aos surdos descumprindo a legislação. O próprio Mec se contradiz ao apoiar uma lei que prevê ensino de português para surdos como segunda lei, mas na prática o fazer como ensino de primeira língua.

Além disso, muitas vezes a criança surda é a única na sala, permancendo isolada de seus colegas ouvintes. Mesmo que a escola ofereça curso de Libras às crianças ouvintes, elas não interagem na sua totalidade com as crianças surdas. E os surdos deixam de ter estímulos linguísticos em Libras o que traria o desenvolvimento na etapa de alfabetização adequado. Percebemos o fracasso da escola inclusiva nitidamente ao avaliar o desenvolvimento dos surdos. Temos duas pesquisas, uma feita pela USP e outra pela UFSC que provam esse fracasso. Segundo a pesquisa de mestrado da professora Mariana Campos, da UFsCar, 50% dos alunos de uma escola inclusiva se sentem tristes e frustrados por não encontrarem artefatos da cultura surda na escola.

O discurso do Mec acusa as escolas de surdos de serem segregacionistas. Isso é uma falácia. Cada vez mais, ganha força a tese de que a segregação é promovida pelas políticas educacionais que reconhecem diferentes línguas e culturas. O argumento é plausível, pois recorre à ideia de que, se queremos unir as pessoas, devemos colocá-las juntas e não separadas. Apesar de ser aparentemente aceitável, essa concepção de inclusão rejeita as diferenças culturais dos surdos e as especificidades linguísticas. Existe o imaginário de que basta colocar um intérprete na sala de aula, uma muleta para o aluno surdo, e estaremos promovendo a inclusão e o bilinguísmo. A maioria dos pesquisadores da área defende que reunir surdos em uma mesma escola ou sala de aula não significa separá-los do mundo ou torná-los mais dependentes. Ao contrário, os ambientes linguísticos que favorecem a vivência de uma língua de maneira espontânea fazem com que os sujeitos se tornem mais autônomos, pois eles alcançam o conhecimento de maneira mais rápida e eficaz. A experiência linguística plena faz com que as pessoas se sintam seguras nas interações sociais e na relação com seus pares. Além disso, quanto maior o desenvolvimento linguístico dos sujeitos, maior a capacidade de buscar conhecimento e de utilizá-lo livremente no seu cotidiano. Eles podem, de maneira independente, transitar no mundo e compreendê-lo. Assim, o conhecimento de mundo adquirido pelos surdos por meio uma língua natural, a Libras, seria mais eficiente.

Patrícia Rezende é surda, Doutora em educação (UFSC), Professora da UFSC e Diretora da Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos (FENEIS)